Por: Michaell Lange,
Londres, 08/07/19 –
A liberdade de imprensa pede socorro no Brasil
A liberdade de imprensa e a liberdade de expressão, são dois dos elementos mais importantes de uma democracia. Nenhuma democracia é de fato verdadeira sem que a mídia e a população, sejam livres para trabalhar e expressar suas críticas, denuncias e opiniões. Apesar do Art.5 da Constituição Federal claramente proteger os direitos mais básicos dos profissionais da mídia, a realidade das ruas não poderia ser mais diferente. O cenário de violência e ameaças, criam uma cultura do silêncio e de auto-censura. Em quase todos os casos de crimes contra jornalistas, ninguém viu ou ouviu nada.
Não é apenas o extremismo político e ideológico que ameaçam a democracia no Brasil. A violência, os assassinatos, e mortes suspeitas, de jornalistas e outros colaboradores da justiça e da democracia, colocam o Brasil num ranking internacional vergonhoso. Jornalistas independentes, bloggers, e apresentadores da mídia local, por vezes, sem visibilidade nacional, e que ousam denunciar crimes praticados por autoridades locais, são os que mais correm risco. Mas, isso não significa que jornalistas, a nível nacional e internacional estejam imunes à violência.
Na lista dos 14 países com maior impunidade para crimes contra jornalistas, apresentado anualmente pelo Comitê Internacional de Proteção ao Jornalista (CPJ), o Brasil aparece em um vergonhoso 10 lugar, com 17 casos de jornalistas assassinados ainda não solucionados. O Brasil aparece em situação pior do que a Russia, Bangladesh, Nigéria e India, que ocupam respectivamente as outras quatro colocações. Somália, Síria, Iraque, Sudão do Sul, Filipinas, México, Colombia e Paquistão, são respectivamente, os primeiros 9 da lista (CPJ).
A Federação Internacional de Jornalistas (IFJ – sigla em Inglês), apresentou um relatório global denunciando a morte de 95 jornalistas durante o exercício da profissão no ano passado. No Brasil, o relatório destaca o assassinato de três radialistas. Segundo o relatório, a corrupção, o populismo e a crescente intolerância, são grandes colaboradores para este cenário, que mata mais jornalistas do que as zonas de conflitos armados (BBCBrasil).
Um relatório da Repórter Sem Fronteiras (RSF), publicado pela BBC Brasil, denuncia a eleição de Jair Bolsonaro, marcado por um discurso de ódio, desprezo pelos direitos humanos, e violência contra jornalistas, como um prenúncio de um período sombrio para a democracia e a liberdade de imprensa no Brasil (BBCBrasil).
No dia 16 de Janeiro, o Jornalista do Jornal de Rondônia, Uéliton Brizon, seguia com sua esposa em uma moto, na cidade de Santo Antonio, distrito de Cacoal no Noroeste do estado de Rondônia, quando foi alvejado por vários tiros disparados por ocupantes de uma outra moto. Brizon, denunciava a corrupção e o descaso das autoridades locais quando foi assassinado. No dia 17 de janeiro, o radialista Jeferson Pureza Lopes, apresentador da radio Beira Rio FM, foi assassinado dentro de casa por dois homens encapuzados, na cidade de Edealina, no estado de Goiás. Segundo a polícia, a mesma radio já havia sido atacada por um grupo que tentara incendiar o local em Novembro de 2017. Jeferson, era conhecido por apresentar um programa polêmico, que desagradava as autoridades locais (RSF). Ambos os crimes continuam sem solução.
O problema com a liberdade de imprensa não é novo no Brasil. O regime militar torturou e matou milhares de pessoas, entre eles jornalistas e colaboradores, no período entre 1964 e 1985. O caso mais famoso, talvez, tenha sido a do Jornalista da TV Cultura, Vladimir Herzog, que em 1975, foi brutalmente torturado e assassinado por militares em São Paulo. O crime rendeu uma condenação ao Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em 2018, por falta de investigação, condenação e punição aos responsáveis (ElPaís).
Em 2004, o então presidente Lula, expulsou do Brasil, o jornalista Lerry Rohter, do New York Times, por ter escrito um artigo afirmando que Lula, teria diminuído suas aparições em público, por estar enfrentando problemas com alcoolismo. Lula, teria dado 8 dias para o Jornalista sair do Brasil. A atitude totalmente absurda e desproporcional do então presidente, rendeu duras criticas em todo mundo, e teria sido o primeiro caso de expulsão de um jornalista desde o final do regime militar em 1985 (TheGuardian).
já, o diretor da divisão das Américas da Human Rights Watch (HRW), José Miguel Vivanco, disse que o atual presidente Bolsonaro, tem razão em criticar os regimes na Venezuela e Cuba pelas violações dos direitos básicos dos cidadãos destes países, “No entanto, ele celebra ao mesmo tempo uma ditadura militar no Brasil que causou um sofrimento indescritível a dezenas de milhares de brasileiros. É difícil imaginar um exemplo mais claro de dois pesos e duas medidas” (Estadão).
Jornalistas conhecidos, nacional e internacionalmente, tem sido vítimas de agressões, e ameaças de morte. Em 2014 a Jornalista da Rede TV, Manuela Borges, foi chamada de idiota e analfabeta pelo então Deputado Federal, hoje presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, por causa de uma pergunta sobre a ditadura militar. Em 2016, o repórter Caco Barcellos da rede Globo, foi agredido durante uma manifestação na ALERJ no Rio de Janeiro, e precisou da ajuda de policiais para deixar o local. A jornalista do SBT, Rachel Sheherazade, o Jornalista Reinado Azevedo da Folha e Rede TV, e também Marco Antonio Villa, sofrem ameaças de morte constantemente por conta dos seus comentários e opiniões políticas. O mais interessante, é que mesmo tendo posições políticas declaradamente de direita, os três jornalistas sofrem ameaças das duas extremidades da política nacional. Assim também acontece com a rede Globo, que é acusada pela esquerda de defender a direita, e é acusada pela direita de defender a esquerda.
O mundialmente premiado jornalista Americano, Glenn Greenwald, do The Intercept Brasil, também tem sido alvo de ameaças de morte. O próprio Ministro da Justiça acidentalmente admitiu que o Jornalista estaria sendo investigado pela polícia, o que fere seu direito Constitucional, depois de publicar mensagens reveladoras, que seriamente põe em risco ao menos um, dos julgamentos da operação Lava-Jato que investiga casos de corrupção no Brasil. Até sua sexualidade foi usada de forma difamatória para atingir o jornalista. Deputados e outras autoridades pedem a imediata expulsão do jornalista do Brasil, que é casado com um Brasileiro e residente no Brasil.
As Redes Sociais, também são responsáveis pela intensificação destes ataques. A liberdade de imprensa, virou alvo de ativistas políticos dentro e fora da internet. Impulsionados pela retórica partidarista e ideológica dos dois extremos, dão legitimidade aos ataques. É um verdadeiro vale tudo, onde nem os direitos humanos é poupado de criticas e condenações.
O Brasil vive um cenário de Faroeste caboclo, bizarro, sem Lei, sem rumo, onde o único objetivo parece ser, a humilhação do adversário a todo custo. Vale atacar a liberdade de imprensa, ameaçar opositores de morte, compartilhar fake news, atropelar qualquer direito ou processo legal. Tudo, em nome da “democracia”. O jornalismo verdade e competente de hoje, pode se tornar o jornalismo lixo e fake de amanhã. Basta uma ordem política, uma matéria jornalística em defesa da lei e da ordem sem nenhum objetivo político e pronto, esta armado o circo. O lado que se sentir prejudicado, que em muitos casos pode ser os dois, se transforma num monstro, cego, burro, incoerente, intolerante, agressivo, e completamente ignorante dos valores mais básicos de uma democracia. Vale destruir a democracia para salva-la da destruição. Acredite, isso faz sentido para muita gente. Como dizia o eterno Jornalista Ricardo Boechat, cuja a morte ainda não foi totalmente explicada, “A riqueza não iguala os homens, mas a miséria sim”. A miséria de bom senso, a miséria de coerência, a miséria de amor ao próximo, a miséria do saber, a miséria de querer o bem sem importar a quem.
A profissão do jornalista no Brasil nunca foi fácil. Mas, ser jornalista no Brasil nos tempos atuais exige muito mais do que coragem e amor à profissão. É preciso sorte para sobreviver, e muita capacidade psicológica para não entrar em parafusos. O ataque à democracia é promovida diariamente por pessoas que dedicam todos os dias das suas vidas, a destruir os princípios e os valores que juntos, são a pedra fundamental de toda sociedade democrática. São de fato, hoje, somos todos Perus votando a favor do Natal. A Democracia pede socorro!