Por: Michaell Lange
Foto: BBC
Londres, 21/03/19 –
Ao contrário de Davos, a visita do presidente Bolsonaro aos EUA pode não ter sido um total desastre. Apesar de ter sido um fiasco diplomático por conta das gaffs do presidente e da ausência de uma agenda diplomática, algo comum e importante nos encontros entre lideres mundiais, houve pontos positivos a serem reconhecidos e algumas questões não menos importantes e preocupantes relacionadas a soberania e aos militares.
Não há dúvidas de que o Brasil tem a ganhar com uma boa relação diplomática com os EUA. Não cabe nem mesmo a consideração comparativa sobre qual dos super poderes mundiais o Brasil deve estar aliado. Nenhum país emergente tem qualquer coisa a ganhar com os Russos, fato! Ja a China, por ser uma potência econômica na qual o próprio EUA é dependente, tem importância econômica incalculável para o Brasil, e o presidente precisa saber lidar com a questão Brasil/China/EUA para não acabar prejudicando o Brasil por motivos insignificantes. Por outro lado, é os EUA que possui a democracia mais bem sucedida do mundo, e mesmo com todos os seus defeitos, ainda é o aliado ideal para qualquer país democrático. Estar aliado aos EUA não é concordar com tudo que os EUA faz. Estar aliado aos EUA, é estar aliado a toda a Europa, ao Canada, Australia, Nova Zelândia e Japão. É estar aliado as maiores democracias do mundo moderno. Países sem históricos democráticos e Cristãos, como a Arábia Saudita e o Qatar, desenvolveram suas economias em alianças comerciais com os EUA. É possível ser um aliado dos EUA sem abrir mão da sua soberania! Mas é fato inquestionável que o oposto também é verdadeiro. A Turquia, Egito e Paquistão, são exemplos de países que sucumbiram as influências de Washington e se tornaram ultra dependentes dos Americanos sem se beneficiarem economicamente dessa relação. Se transformaram em postos avançados dos EUA e isso é muito ruim para qualquer nação. Como o Brasil irá se beneficiar com essa nova aproximação irá depender do poder de negociação e da capacidade diplomática do atual governo Brasileiro, e isso é motivo de grandes preocupações.
Os dois presidentes tem características semelhantes. Bolsonaro e Trump compartilham um comportamento apolítico, muitas vezes ofensivo e extremamente polêmico. Ambos são acusados, de serem racistas, machistas, homofóbicos, preconceituosos e estarem envolvidos em casos de corrupção. Estas características em comum colocam os dois lideres na mira implacável da mídia mundial, e isso não deve ser visto como algo ruim. Porém, outros aspectos colocam os dois líderes oceanos a parte. Trump é um mestre das negociações. Homem de negócios que mesmo falindo duas vezes, conseguiu reerguer-se e ser eleito ao cargo mais poderoso do mundo. Esperto, astuto, oportunista, ganancioso, duro, coercitivo, negociador. Trump, tem a habilidade de falar absurdos que colocaria fim a carreira de qualquer político Norte Americano, sem abalar sua fortaleza política. Dificilmente influenciável, e de personalidade forte, Trump teve coragem de questionar as principais agências do seu país como o FBI, a CIA e o Pentágono e continuar no poder. Bolsonaro vem de uma formação militar arcaica. Não foi surpresa ter nomeado vários militares para seus Ministérios. Sem nenhuma experiência profissional no setor privado, e nenhuma formação econômica, o Presidente do Brasil demonstra robustez militar nas palavras, mas ainda não provou ser capaz de controlar seus próprios subordinados no governo. Parece haver uma confusão entre a hierarquia militar e a hierarquia governamental no governo Bolsonaro. Falta liderança. Bolsonaro não é nem de longe, um bom negociador. Suas incontáveis gaffs demonstram um grave despreparo nas negociações comerciais e diplomáticas com outros países. A admiração demasiadamente explicita pelos EUA coloca o Brasil em posição inferior na mesa de negociações. O Brasil ja começa em desvantagem. É importante lembrar que nas relações internacionais não existem amigos. Existem aliados com interesses semelhantes. Não existe confiança entre nações mas desconfianças sempre. Obama grampeou os telefones dos seus principais aliados como o primeiro ministro do Reino unido e da Chanceler da Alemanha. Nas relações internacionais não há lugar para amadores, muito menos de admiradores e fã clube. Bolsonaro em alguns momentos parecia um fã do Justin Bieber.
A questão militar também é um problema. As forças armadas Brasileiras estão sucateadas. Os militares Brasileiros, sempre sonharam em ter nas mãos equipamentos militares Americanos, e quem os culparia por isso? Qualquer exercito do planeta almeja equipamentos de ponta. Com a vitória democrática dos militares nas ultimas eleições, o governo Brasileiro terá legitimidade para receber ajuda militar Norte Americana se assim escolher. A questão é; a que custo? Bolsonaro terá em suas mãos a responsabilidade de negociar com uma verdadeira águia de rapina chamada Trump e aí, surge uma nova questão. Até que ponto Bolsonaro esta preparado para esse duelo? Além de ter que lidar com Trump, Bolsonaro terá que lidar com o desejo incontrolável dos militares por novos equipamentos de guerra.
A desvantagem dos governos de esquerda em odiarem os EUA, tinha um lado positivo. A desconfiança das intenções Americanas. Bolsonaro deveria ter usado essa tática básica do pensamento realista político na hora de elogiar a mais bem sucedida democracia do mundo da forma como fez. Preferiu deixar a informalidade e sua admiração pessoal tomar conta do debate e acabou fazendo gol contra. Ficou parecendo um encontro de um fã com seu grande ídolo ao invés de um encontro entre dois lideres. Bolsonaro irá precisar de um time competente de assessores, algo que ele ainda não tem. O poder de persuasão de Trump é muito superior ao de Bolsonaro que por vezes pareceu nervoso e intimidado com a presença de Trump. Bolsonaro demonstrou desconhecimentos básico do realismo político e diplomático, causando situações constrangedoras. Existe uma diferença brutal na linguagem diplomática entre afirmar ser um grande admirador da democracia Americana e afirmar ser um grande admirador da America. Bolsonaro não seria a única vitima do poder de persuasão de Trump. A Chanceler Alemã, Angela Merkel e o Presidente da França, Emmanuel Macron também sofreram nas mãos de Trump. Mas as questões Francesas e Alemãs não são problemas Brasileiros. O importante é que Bolsonaro tenha a habilidade de negociar boas relações e bons acordos comerciais e não apenas militares, com os Americanos, sem precisar vender a metade do país em troca. No ultimo pronunciamento de bolsonaro no encontro, durante a coletiva de imprensa junto com Trump, Bolsonaro foi quase perfeito. Um discurso agora, com linguagem apropriada e direta, bem diferente do que ocorreu no primeiro momento. Talvez seja um sinal de amadurecimento do presidente que ja não foi tão mal como em Davos, mas ainda há muito o que ser provado.
No primeiro jogo dessa nova relação EUA/Brasil, Bolsonaro não perdeu de goleada, mas perdeu o jogo. O Brasil chegou buscando um modesto empate e levou logo um 2 a 0. É importante que Bolsonaro copie a tática de negociação de Trump e tenha um pouco mais de ambição, caso contrario, o Brasil corre o risco de ser mais uma Turquia ao invés de se tornar um Qatar mesmo com potencial de ser um grande Brasil. Apesar de pequena, existe uma chance dessa relação ser frutífera. O tempo irá dizer…