By: Michaell Lange,
London, 11/11/15 –
Hoje, é o dia em que os Britânicos comemoram o chamado “Armistice Day”, dia de lembrar e demonstrar respeito aos combatentes da Primeira Guerra Mundial e todos os mortos de todas as guerras. Todos os anos, às 11 horas do dia 11, do mês 11, os Britânicos param por 2 minutos para lembrar o momento em que os canhões e os rifles foram silenciados pelo fim da Primeira Guerra Mundial. A guerra que acabaria com todas as guerras, falhou em todos os seus objetivos, sobretudo no que se refere a Paz duradoura. Apenas uma década depois do fim da grande guerra, o mundo voltou a ficar de joelhos com a depressão econômica de 29. Dez anos mais tarde, em 1939 a Segunda Guerra Mundial veio provar que nem a Europa nem os EUA, aprenderam as lições do passado.
Hoje, comemoramos a vida daqueles que morreram por nossa causa, incluindo mais de 3 mil Brasileiros que perderam suas vidas durante a segunda guerra mundial. O Brasil foi o único país da America do Sul a enviar combatentes para a Segunda Guerra Mundial. Eu, como Brasileiro, aprendi a prestar meu respeito aos mortos das duas guerras mundiais, porque em ambos os casos, se os aliados não tivessem vencido a guerra na Europa, o Brasil certamente seria o próximo alvo por conta das nossas reservas naturais de energia e minérios. As estimativas de mortes nos dois conflitos variam, mas estima-se que 100 milhões de pessoas perderam suas vidas nos dois conflitos, incluindo 7 milhões de militares e 11 milhões de civis na primeira guerra mundial, e 55 milhões de civis e 25 milhões de militares na segunda guerra mundial. Meu maior questionamento sobre o maior holocausto de inocentes da história humana é; Sera que todos aqueles inocentes morreram em vão? Sera que apenas lembrar o sacrifício e todos os horrores da guerra, sem termos aprendido nada com as lições do passado, é o suficiente para demonstrar respeito por tantas mortes? Apenas na primeira década do século 21, assistimos a duas guerras envolvendo a Europa e os EUA que resultaram na morte de mais de 1 milhão de civis e milhares de outros desalojados. A crise econômica de 2008 foi a pior desde a depressão de 29. Os conflitos na Síria, financiados pela Europa e EUA, ja deixaram mais de 130 mil mortos e resultaram na maior crise de refugiados desde a segunda guerra mundial. Como não lembrar das vitimas de duas grandes guerras sem sentir ao mesmo tempo, profunda vergonha e desrespeito por não termos aprendido a lição da devastação e sofrimento causado pelas guerras?
O Britânico Harry Patch, ficou conhecido como o último sobrevivente a lutar na primeira guerra mundial. Harry morreu em 2009 aos 111 anos, mas como muitos outros soldados, Harry não morreu em vão. Em 1917 foi enviado para lutar na linha de frente na França onde foi ferido na explosão de uma bomba que matou 3 de seus amigos. Harry, assim como seus amigos, não teve escolha. Se ele se recusasse a lutar, a punição era o pelotão de fuzilamento. Mas, harry era um pacifista que como eu, nunca quis matar ninguém, nem lutar em guerras estúpidas causadas por lideres incompetentes que nunca mandarão seus próprios filhos para a guerra. Ao chegar na linha de frente, Harry e mais 5 amigos fizeram um pacto secreto de nunca matar um único homem. Por grande parte dos seus 111 anos de idade, Harry precisou esconder seu pacto pacifista, porque se fosse descoberto, mesmo depois de tanto tempo após o fim da guerra, ele ainda poderia ser condenado por traição a patria. Pouco antes de morrer, Harry resolveu falar o que pensava sobre a guerra. Para ele, as guerras são “massacres calculados” e os mortos são vitimas de governo incompetentes. Para Harry, uma guerra não poderia valer mais do que uma vida. Durante um encontro com o então Primeiro Ministro Britânico, Tony Blair, Harry teria dito: “Os políticos que nos levaram a guerra deveriam ter escolhido as armas e resolvido o problema entre eles, ao invés de legalizar massacres em massa”. Harry também teria dito a Tony Blair que: “nenhum soldado deveria ter sido condenado a morte por covardia pois, as guerras não passam de assassinatos organizados”. Tony Blair teria dado uma desculpa qualquer antes de sair caminhando da conversa. Quantos soldados como Harry, foram forçados a lutar uma guerra por conta do orgulho, da teimosia e da incompetência de um líder? Quantos jovens ainda serão iludidos e seduzidos pela propaganda militar antes de serem obrigados a lutarem em guerras estúpidas para defenderem os interesses privados de pessoas que jamais terão coragem de colocar suas próprias vidas em risco? Quantos jovens ainda serão condenados por lideres inescrupulosos, a conhecerem a verdadeira tragédia de um conflito e a total incapacidade de uma luta armada proporcionar qualquer possibilidade de paz duradoura?
Enquanto escrevo estas linhas, o relógio marca 10:25. Em pouco mais de meia hora, irei parar juntamente com outros milhares de Britânicos para prestar minhas homenagens aos mortos da primeira e segunda guerra mundial, mas não vou esconder minha profunda frustração, vergonha e revolta, por viver num mundo que se recusa a aprender as lições do passado, e que por isso, estará condenado a repetir os mesmos erros responsáveis pela morte de 100 milhões de inocentes, vitimas da própria indiferença humana. Daqui a pouco, os carros irão parar e seus motores serão desligados. Trens, ônibus e o sistema de metro, também irão parar por 2 minutos. A TV e o rádio irão transmitir a imagem e o som do sino do Big Ben batendo onze vezes. Políticos e trabalhadores, nas construções e nos escritórios irão se juntar a outras milhares de pessoas nas ruas de Londres para fazerem 2 minutos de silêncio. Mas, o legado de soldados como Harry Patch, de que bombas jamais levarão a humanidade a paz duradoura, continuara a ser ignorada. Muito ouve-se falar sobre as ameaças que as mudanças climáticas podem trazer para o futuro da humanidade, mas pessoalmente, acredito que os lideres mundiais continuam sendo a maior ameaça a vida na terra. Cabe a nossa geração de pais, passar a nossos filhos uma mensagem diferente para que as futuras gerações possam desfrutar de paz e a guerra seja apenas um assunto para os livros de história.
Harry Patch
Armistice day London
Michael, tão importante como a conscientização, que mobilizaria as pessoas a recusarem participação num conflito armado, é percebermos nossa condição atual de público no teatro das grandes decisões, onde se assiste a promiscuidades da relação entre os governos e o poder financeiro. A maior parte dessas decisões passa ao largo do interesse comum, privilegiando membros de um seletíssimo grupo, replicando um modelo medieval. Perversamente, o distanciamento ético cultural se agrava paralelo à concentração de renda e poder. Ou seja, aos olhos daqueles, que de alguma forma conseguem entrar para esse seletíssimo grupo, o pobre, o eleitor, o contribuinte figura como uma sub raça descartável. A solidariedade se dilui num caldo de conceitos cujos objetivos são a manutenção desse sistema.