Por: Michaell Lange.
Londres, 11/01/15
Uma multidão de mais de um milhão de pessoas caminharam hoje pelas ruas de Paris em apoio a liberdade de expressão e em solidariedade as vitimas e familiares das pessoas mortas nos ataques desta semana. Dados oficiais falavam entre 1.2 e 1.6 milhões de pessoas, mas segundo várias agencias de noticia o número pode ter chego a 3 milhões de pessoas. Segundo a mídia local a cidade não via um número tão grande de pessoas numa única manifestação desde a libertação de Paris das mãos dos nazistas em 1944. Neste Sábado (10 ) dezenas de milhares de Alemães foram as ruas de Dresden numa manifestação contra o racismo e a xenofobia. Dresden se transformou no centro dos protestos de grupos anti-imigrantes organizados por um novo movimento chamado PEGIDA. Em Londres, milhares de pessoas incluindo turistas de todo o mundo se reuniram em vários pontos da cidade incluindo Trafalgar Square e Tower Bridge que foram iluminadas com luzes com as cores vermelha, branco e azul em apoio aos Franceses. Em Paris, um momento marcante do dia foi um abraço bastante emocionado entre a Chanceler Alemã, Angela Merkel e o Presidente Frances, Fraçois Hollande. Angela Merkel caminhou o tempo todo ao lado do presidente Frances. Participaram da caminhada 44 lideres mundiais incluindo o secretario geral da ONU Ban Ki-moon.
Lideres Muçulmanos como o presidente da Palestina Mahmoud Abbas também estavam presentes mas não recebeu a mesma atenção que outros lideres como o Primeiro Ministro de Israel Benjamin Netanyahu que foi recebido com aplausos pela multidão.
Numa analise critica dos acontecimentos de hoje pode-se dizer que ficou claro que, apesar das intenções da manifestação, a impressão deixada foi a de que o ocidente se uniu contra a ameaça Islâmica. Tanto o Presidente Frances quanto o Primeiros Ministro de Israel, assim como Angela Merkel e David Cameron mantiveram a devida distancia dos lideres Muçulmanos presentes. Talvez tenha-se perdido, provavelmente por motivos políticos, a oportunidade de demonstrar realmente uma vontade de unidade entre lideres Judeus, Cristãos e Muçulmanos contra o radicalismo religioso e não apenas contra o radicalismo Islâmico. Obviamente que não deveríamos esperar um abraço entre os lideres de Israel e Palestina, mas talvez um aperto de mão tivesse dado um sinal importante na busca de um caminho menos violento nas questões entre os dois países e entre as religiões envolvidas. O próprio presidente Frances deveria ter demonstrado mais proximidade com Mahmoud Abbas para também demonstrar a importância da união contra o radicalismo religioso. Durante todo o dia a mídia falou apenas sobre o radicalismo Islâmico sem dar ênfase também ao radicalismo de uma forma geral não menos importante. A comissão de frente da marcha de hoje destacava apenas lideres de países Cristãos com exceção do presidente de Mali, pais Africano onde 55% da população é de Muçulmanos moderados e o presidente palestino. Talvez o ideal teria sido ter ao seu lado o Primeiro Ministro de Israel e o Presidente da Palestina numa demonstração clara de união contra o radicalismo e a favor da liberdade de expressão em todos os níveis. Obviamente que o custo político de tal ação não valeria o risco. A França reconheceu recentemente a Palestina como estado legitimo o que não agradou Israel. De qualquer forma perdeu-se uma oportunidade de demonstrar vontade política de união entre os lideres. In 1978 por exemplo durante a guerra civil na Jamaica, o cantor Bob Marley promoveu o One Love Concert, que reuniu os dois lideres opositores e peças chave da guerra civil no país. Depois de cantar a musica “Jammin” (juntar-se), Bob chamou os dois lideres políticos ao palco e juntou as mãos dos dois lideres sobre sua cabeça fazendo uma rápida oração. O impacto da demonstração dos lideres foi imediato. Os combates nas ruas acabaram e o povo se reconciliou. Hoje em Paris algumas oportunidades que poderiam ter tido um impacto maior foram desperdiçadas. Também nas rádios e na TV oficiais de segurança nacional como o MI5 do Reino Unido afirmaram que o mundo esta em guerra contra o radicalismo Islâmico, afirmação que certamente não colabora com a intenção de unir o planeta contra todo tipo de radicalismo social.
Ainda durante a marcha de hoje segundo a agencia de noticias Reuters, várias mensagens nas redes sociais da França demonstravam insatisfação com o slogan “Je suis Charlie” (eu sou Charlie) numa interpretação de liberdade de expressão a todo custo. Algumas mensagens falavam de hipocrisia dos lideres mundiais cujo os países tem uma mídia repressiva mas estavam em Paris cobrindo as manifestações. Uma outra critica que rondou as redes sociais foi a baixa cobertura dos ataques terroristas na Nigéria que deixaram mais de 2 mil mortos em apenas um dia. Fica a impressão de que 17 Franceses tem muito mais valor do que 2 mil Nigerianos. A mídia parece ter maximizado o ataque em Paris por se tratar de uma cidade Européia. Mas, será que teríamos visto a mesma repercussão se o mesmo ataque tivesse ocorrido em algum país da Africa? Muita gente acredita que não.
Sem duvidas que as manifestações de hoje terão impacto na forma como a pessoas e as instituições promovem a liberdade de expressão assim como também os debates sobre os possíveis limites dessa liberdade continuarão ainda por muito tempo. Além disso, o governo e a sociedade Francesa precisarão fazer uma profunda reflexão na forma como grupos minoritários são tratados na frança. O processo de integração de grupos étnicos e religiosos parece não ter dado muito certo no país enquanto em outros países como o Reino Unido esse processo tem sido muito mais positivo. A França proibiu o uso da burca (burqa) no pais em 2010 e foi duramente critica por instituições dos direitos humanos. A população de Islâmicos vive em sua maioria nos guetos ao redor de Paris e mesmo aqueles que nasceram na frança não são visto pela sociedade como legítimos franceses. Muitos franceses de segunda e terceira geração de imigrantes reclamam das dificuldades em sair e entrar no país por conta da desconfiança dos oficiais de imigração nos aeroportos e estações de trem. Muitos reclamam de ter que responder a perguntas sobre como adquiriram passaporte francês todas as vezes que entram ou saem do país.
Durante todo o dia apresentadores de TV, entrevistadores e entrevistados fizeram questão de frisar que o terrorismo não venceu. Mas a verdade é que 17 pessoas foram brutalmente assassinadas, a população esta com medo e principalmente a comunidade Judaica esta abalada e aflita. No Reino Unido e EUA o nível de risco para ataques terroristas foram elevados e os governos sofrem pressão para investir mais em segurança. Apesar da principal impressão dos protestos de hoje terem sido sobre a importância da liberdade de expressão, os problemas por trás dos ataques em Paris são bem mais profundos e complexos. Os investimentos em segurança não serão os únicos desafios da França. A questão social precisa ser resolvida. Enquanto as minorias continuarem a serem tratadas como estrangeiros, os problemas continuarão e os riscos de jovens caírem nas maos de grupos extremistas continuara alto. Hoje foi um dia de reflexão em quase todo o mundo, mas se amanhã não acordarmos diferentes, o mundo continuara sendo o mesmo.